Produção de soja no RS registra forte queda em meio à estiagem prolongada

A safra de soja 2024/2025 no Rio Grande do Sul foi marcada por uma queda na produção, reflexo direto da estiagem que afetou o Estado por um longo período. De acordo com dados divulgados pela Emater, a produção totalizou 13,2 milhões de toneladas, o que representa uma redução de 27,4% em comparação ao ciclo anterior, quando foram colhidas 18,2 milhões de toneladas. Em relação à estimativa inicial de 21,6 milhões de toneladas, a retração chega a 38,8%.

Com a colheita tecnicamente finalizada, os números confirmam que esta foi a oitava maior safra da oleaginosa já registrada no Estado, mas os impactos climáticos severos colocam o desempenho do setor agropecuário sob alerta.

Estiagem prolongada compromete lavouras no interior

A estiagem atingiu de forma desigual diferentes regiões do Estado, mas provocou perdas expressivas em áreas tradicionalmente produtivas. No município de Camargo, por exemplo, o produtor Jean Filippe viu sua colheita despencar. Em seus 35 hectares de soja, a produtividade não passou de 21 sacas por hectare, um dos piores resultados de sua trajetória no campo.

Este foi o pior ano de todos. Se a chuva demorasse mais, não teria o que colher, relatou Filippe, ressaltando o impacto direto do período de 45 dias sem precipitações em sua propriedade.

A situação enfrentada pelo agricultor não foi isolada. A estiagem teve caráter heterogêneo, com perdas que variaram até mesmo entre propriedades vizinhas. A falta de regularidade nas chuvas impôs um desafio adicional à agricultura gaúcha: lidar com a imprevisibilidade climática.

Produtores relatam disparidades de produtividade

Em Condor, no Noroeste gaúcho, o produtor e presidente do Sindicato Rural local, Gilberto Costa Beber, conseguiu manter uma média de 50 sacas por hectare, abaixo das 75 do ano anterior, mas superior às 33 sacas registradas durante a estiagem de 2023. Ele atribui o desempenho ao plantio precoce, realizado em outubro, e à sorte de contar com chuvas pontuais.

Tenho vizinho ao lado que colheu quase 20 sacas a menos, mesmo com os mesmos cuidados. Não dá para prever mais nada, afirmou Beber.

Esse contraste nos resultados reforça a avaliação da Emater, que já havia antecipado o comportamento "em mosaico" da produção. O diretor técnico da entidade, Claudinei Baldissera, destacou que a média estadual de produtividade caiu para 1.957 kg/ha, frente aos 3.179 kg/ha projetados antes do plantio, uma queda de 38,4%.

Diferenças regionais acentuadas

O cenário heterogêneo da safra foi evidenciado pelas diferenças regionais. Enquanto Passo Fundo registrou média de 61,2 sacas por hectare, a região de Bagé colheu apenas 41,3 sacas por hectare, uma discrepância de quase 20 sacas em um contexto que, mesmo em anos normais, já exige ajustes constantes na gestão das propriedades.

Essas variações devem orientar decisões futuras, como investimentos em irrigação e estratégias de manejo, observou Baldissera.

Produção em risco e custos elevados

Para muitos produtores, a combinação entre clima adverso e custos fixos elevados torna o cenário ainda mais desafiador. Endividados e com pouca margem de lucro, muitos enfrentam dificuldade para manter a operação.

Neste ano, com 50 sacas, eu só empato. A reserva que tínhamos está se esgotando por causa do custo e do clima, relatou Beber, em entrevista concedida a um website de notícias do setor.

A situação reforça a necessidade de políticas públicas mais eficazes para enfrentar os desafios impostos pelas mudanças climáticas e garantir a continuidade da atividade agrícola no Estado.

Com o encerramento da safra 2024/2025, os dados consolidados revelam tanto o impacto de uma estiagem severa como a urgência de adaptação da produção gaúcha a um ambiente cada vez mais instável e imprevisível.

Outros cultivos de verão também foram afetados

A escassez de chuvas atingiu, ainda que em menor escala, outras culturas do verão. O milho teve uma retração de 9% em relação ao volume inicialmente estimado, mas a produção total deve chegar a 4,8 milhões de toneladas, o que representa um crescimento de 7,5% em comparação à safra anterior.

No arroz, o desempenho foi mais positivo: a colheita alcançou 8,3 milhões de toneladas, com aumento de 15,3% em relação ao ano passado. A produtividade também foi ajustada para cima, passando de 8.478 kg/ha para 8.558 kg/ha.

Baldissera ressalta que, no caso do milho, o avanço da irrigação foi determinante para os bons resultados em algumas áreas, especialmente no Norte do Estado, onde o tempo foi mais favorável no início do ciclo.

Impactos econômicos e projeções preocupantes

A queda expressiva na produção de soja deve gerar consequências para a economia gaúcha, já que o agronegócio representa uma parcela relevante do Produto Interno Bruto (PIB) estadual. Em 2024, mesmo com enchentes em determinadas regiões, o PIB do Estado apresentou crescimento de 4,9%. No entanto, a expectativa para 2025 é de desaceleração.

Segundo o economista-chefe da Federação da Agricultura do Rio Grande do Sul (Farsul), Antônio da Luz, a estiagem é ainda mais danosa economicamente do que eventos como enchentes.

As enchentes são mais visíveis, mas as estiagens afetam silenciosamente toda a cadeia produtiva e geram perdas persistentes, afirmou.

A defasagem entre o PIB do Rio Grande do Sul e o nacional já é de 12%, acumulada desde a estiagem de 2022. Com as perdas de 2025, essa diferença pode se ampliar ainda mais, impactando diretamente milhares de produtores e dificultando a sustentabilidade das atividades no campo.